Um ano se passou e aqui ainda estou escrevendo para você que me acompanha há anos ou algumas horas, mas está aqui porque tem curiosidade ou mesmo adora a cultura chinesa, como eu.
Muitos tem me perguntado como tem sido essa vida fora da China depois de tanto tempo, afinal foi praticamente 1/3 da minha existência com a “China na minha vida”!
Na realidade, eu mesma tenho me questionado até quando manterei esse blog, o instagram, as palestras e cursos sobre a cultura chinesa, que me encantaram e deram outro sentido a minha vida pessoal e profissional.
E a resposta é: não sei… rs.
Se por um lado nossa saída da China foi consciente e planejada (afinal sempre disse que a vida para o estrangeiro lá têm começo, meio e fim), sem traumas e nem surpresas em relação a pandemia, por outro o apego a tudo que construí em torno dessa cultura e desse país me faz ponderar o que fazer com toda essa vivência e conhecimento, com toda essa bagagem que não pode ser encaixotada e enviada para algum armário e esquecida para sempre.
Como tudo que vivemos, desde nossa tenra infância, a fase da China na minha vida também faz parte da pessoa que me tornei depois de tantos anos. Está lá, não se apaga, não se esquece, não se abandona de si mesmo.
Lidar com todos esses sentimentos de “pertencimento” e ao mesmo tempo de “despertencimento” tem me colocado em questionamentos internos diariamente.
Comparo com a nossa relação com a casa de nossos pais onde crescemos e nos pertence e, quando saímos para nossa vida solo, ainda temos um apego a ela, mas sabemos que não é mais a nossa casa de fato, apesar de não deixar de ser, afinal lá estão nossas histórias, alguns pertences deixados para trás (que nossos pais fazem questão de manter nos armários, mesmo sob protesto), aquela caneca predileta, o nosso lugar na mesa.
A diferença (imensa) é que para a casa dos nossos pais, sempre poderemos voltar. Não que será a mesma coisa, mas na maioria dos casos temos o colo e a ligação eterna (mesmo que eles nem morem mais na mesma casa, o sentido vai além das paredes, portas e janelas).
Já a minha relação com a China, não tem volta e está cada dia mais distante. Não tem o colo reconfortante para voltar, não tem nada esquecido no armário, não tem o vinculo material. Tem a minha lembrança e, tenho plena consciência, que é unilateral.
Então isso me deixa um vazio, um elo perdido que certamente só faça sentido para mim.

E a saudade?
Claro que ela existe! Saudade da comida, de passear sem rumo pelas ruas limpas e arborizadas, das lanternas, telhados, portas e lugares que sempre me encantaram, da praticidade da vida chinesa, do taobao (uma dos pontos cruciais de saudosismo de quem deixa a China, rs), de ter que matar um dragão por dia para sobreviver, dos perrengues que “depois que passa a gente ri”, das histórias colecionadas na memória.
Tudo isso existe, mas não me incomoda. Na realidade me enche o coração de alegria, um saudosismo gostoso, a certeza de que vivi muito bem, que aprendi coisas imensuráveis, que conheci pessoas maravilhosas e especiais. Um sentimento de gratidão que não consigo descrever.
O que hoje está pegando mesmo é essa crise de identidade: quem sou eu na fila do pão?
Estou aqui escrevendo e rindo de mim mesmo, pois o meu lado racional diz: segue em frente e arruma outra fila para andar. E o emocional está apegado a essa parte de mim que injetou a China na veia, na vida, literalmente, e não sabe o que fazer com ela agora. A tatuagem que não fiz, mas da qual não consigo me livrar.
Talvez se eu não tivesse investido tanto tempo em estudar e me embrenhar na missão de mostrar que a China tem um lado mágico, lindo e que a cultura vale a pena ser conhecida e entendida por todos, fosse mais fácil essa desassociação de papeis.
Seguimos
Mesmo com todas essas dúvidas, esses questionamentos, vou seguindo. E resolvi passar aqui e deixar esse desabafo, pois já me acostumei a dividir meus insights sobre a vida com você que me lê semanalmente, que me acompanha, que vibra comigo, que sempre foi o maior incentivador do meu trabalho.
Posso sumir de vez em quando, mas não vou desaparecer. Todo esse material que está aqui (ou nas redes sociais) tenho certeza que ainda vai ajudar muita gente.
Todo o carinho que tenho por esse trabalho vai continuar existindo e a interação direta vai continuar, pois se tem algo de precioso que esse trabalho me deu ao longo dos quase 13 anos de blog, foram os amigos que fiz através dele. Muitos conheci pessoalmente, outros estamos há anos nos falando por mensagens, emails ou até áudios esporádicos. Fora as pessoas que reencontrei pela vida graças ao “China na minha vida”.
Resumindo, acho que esse será sempre o meu dilema de vida: até quando e quanto a China ainda estará presente na minha vida futura?
E a resposta também é: não sei! rs
Só sei que continuarei seguindo, indo em novas direções, mas sem deixar essa vida chinesa de lado. Buscando outros amigos, outras aventuras, mas sempre lembrando o que conquistei na China. Entendendo que o tempo que vivi não volta e mesmo que eu pudesse ir a China amanhã, não seria mais a mesma coisa, pois a China também mudou nesse último ano.
Meu respeito e admiração por essa cultura sempre estará presente.
Minha gratidão por esse país será eterna.
Minha consciência que esse tempo passou é clara.
Meu espaço de interação e compartilhamento do que sei, do que aprendi com o Dragão, continuará aberto a você e a quem precise de informação.
Meu trabalho em relação a cultura chinesa (palestras, mentoria, assessoria) vai continuar, mas de uma nova maneira. Tudo pode ser reconstruído, não é mesmo?
Obrigada por sempre estar aqui!
Até a próxima!
Zái Jián!
PS: o curso online “Curiosidades e Fatos sobre a Cultura Chinesa” continua com inscrições abertas. Uma ótima oportunidade para conhecer um pouco mais de tudo que vivi e aprendi nesses anos de China.
Simplesmente, amei!!! Bjs
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É engraçado ler esse post nesse momento. O blog me ajudou muito quando me mudei pra China, e agora que estou de volta no Brasil (voltei no fim do ano passado), sinto exatamente a mesma coisa. Tb sempre soube que estar lá não era para sempre, e o que me ajuda a seguir em frente é pensar que mesmo que eu voltasse, não seria a mesma coisa já que mesmo ainda tendo amigos lá, muitos deles já deixaram a China tb. Então, vida que segue!
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Isso mesmo Analu, vida que segue, mas como gostamos de divagar sobre as coisas que nos rodeiam, nada melhor do que um monte de palavras para colocar as ideias em ordem.
Seguimos pelo mundo, apesar dos pesares (já não bastava a pandemia e aí engatamos numa guerra…).
Beijo grande,
Chris
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Obrigada Enviado do meu iPhone
>
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Certamente você expressa o sentimento e sensação de muitos de nós. Confesso que ainda não me encontrei em nosso “novo habitat” ….(bem, são mais de 5 anos já, portanto não é ‘novo” exatamente … se descontarmos os mais de 2 anos de pandemia poderia considerar que são 3 anos) …. mesmo assim, a sensação de “não pertencer” se agrava a cada dia pra mim…. aqui acabei me isolando, me introvertendo, coisas que nunca fui! Como já disse alguém com propriedade, acho até que foi você mesma: “a gente sai da China mas a China não sai da gente!”
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Ahhh Denise,
Exatamente, essa é uma das minhas frases que ficaram marcadas na China, junto com “o que a China uniu o mundo não separa” e “ninguém vai a China e sai ileso” hahaha todas verdadeiras e para mim, no momento, fazem mais que todo o sentido que eu coloquei nelas quando comecei a repetir isso.
Você é uma das parceiras, das pessoas que entendem esse sentimento ambiguo que a China nos permite ter.
Sobreviveremos, tenho certeza. Como diz uma amiga que também tem a mesma experiência: as viúvas da China. hehehe
Obrigada pelo seu depoimento. Estamos juntas!
Chris
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Christine, parabéns por seu belíssimo depoimento, carregado de sensibilidade, amor e respeito. Concordo com todos os seus questionamentos e afirmações. Parece contraditório, mas não é …. Acompanho seu blog interessantíssimo e gostaria de te dizer que com sua inteligência e capacidade logo estará nos brindando com outras novidades. Um beijo.
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Obrigada Gloria!
Gratificante mesmo é receber tanto carinho.
Seguimos!
Chris
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Chris excelente colocação sobre seus feelings. Fiquei emocionada e feliz. Muito obrigada!
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Obrigada, Dalva!
Você está entre os presentes que a China me deu.
Beijo imenso.
Chris
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Christine: Seu grande legado da China foi descobrir que você relata bem e observa bem…agora que você está aqui no Brasil, porque não se embrenhar e descobrir esse Brasilzão e relatar para todos os seus leitores aspectos desconhecidos!!!
Mãos a obra!!! Othon Barcellos
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Obrigada Othon!
Sim, a descoberta da escrita foi um dos grandes presentes que essa experiência na China me deu.
Agora estou em Portugal, mas redescobrir o Brasil e contar sobre esse novo olhar, é uma ideia tentadora.
Grande abraço!
Christine
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