Há alguns dias fui fazer uma visita guiada à Associação de Caligrafia e Pintura de Shanghai, pois realmente me encanta essa arte de escrever com os pincéis.

Na contra mão da grandiosidade das coisas na China, o local fica numa casinha bem modesta num Shikumen (construção típica de Shanghai) na Concessão Francesa. Na realidade, nesse local a grandiosidade está na mão dos artistas que convivem ali e propagam sua arte milenar, passando os ensinamentos de geração a geração. Hoje a associação de Shanghai conta com 55 membros.

A intenção dessa visita, que foi promovida por uma associação para expatriados que há na cidade, foi de conhecer um pouco mais a fundo a  experiência profissional de alguns dos seus membros, os diferentes tipos de caligrafia, e aprender um pouco sobre a cultura caligrafia chinesa.

Sobre a Caligrafia Chinesa

A caligrafia chinesa ou a arte da escrita, como eles costumam chamar,  é uma parte importante da cultura chinesa, e tem sido tradicionalmente considerada como a mais elevada forma de arte visual na China. Com uma história de mais de cinco mil anos, a caligrafia chinesa é rica em conteúdo e tem atraído a atenção de artistas de todo o mundo.

O nome local para a caligrafia na China é Shūfǎ – 書法,  que significa literalmente o caminho (regra ou lei) da escrita.

A caligrafia chinesa é tão abstrata e, ao mesmo tempo, é considerada a capacidade mais reveladora de uma pessoa na cultura chinesa. Ela também é considerado como uma forma ativa de manter a saúde física e mental em harmonia. Historicamente, muitos artistas de caligrafia na China eram conhecidos por sua longevidade.

E tenho que fazer um adendo aqui: o membro mais velho dessa associação tem 94 anos e estava por lá dando seus palpites, fora que o fundador da mesma, tem 102 e, segundo os colegas, às vezes aparece!

E também tem um artigo que escrevi o ano passado sobre um senhor que escrevia seus poemas numa praça, para serem apagados depois, pelo simples fato de treinar e treinar. Existem muitos que escrevem com água, e isso é bem comum de se ver por aqui, principalmente nos parques.

Segundo o presidente atual da associação, fazer a caligrafia (e a pintura – que é encarada como uma forma desenvolvida da caligrafia), é um momento de ‘amor’ e reflexão sobre a vida e nossos costumes.

Interessante. Isso é a alma do artista!

Os quatro tesouros da caligrafia

As ferramentas de caligrafia são o papel, a tinta, a pedra de pintar e o pincel, que são chamados de  “os quatro tesouros” dessa arte.

Os pincéis mais comuns são os de pele de carneiro (mais macio) e de lobo (mais duro), e para alguns trabalhos, eles usam um pincel que é a mistura dos dois. Mas também podem ser  de uma grande variedade de animais, incluindo a doninha, coelho, veado, galinha, pato, porco, tigre.

Li também que há uma tradição de fazer um pincel usando os cabelos do recém-nascido, como uma lembrança para a criança no futuro. Esta prática está associada a lenda de que um estudioso chinês antigo passou, na primeira tentativa, nos concorridos exames imperiais usando o pincel feito com seu próprio cabelo.

O cabo do pincel pode ser  de bambu ou materiais nobres como o sândalo vermelho, cristal, marfim, prata e ouro. A grossura e o tamanho dos pincéis também variam, e a beleza deles deixa qualquer um louco (leia-se eu) quando se depara com uma loja especializada!

Os pincéis de caligrafia são considerados como uma extensão do braço do calígrafo.

Hoje em dia, a caligrafia também pode ser feita usando uma caneta, mas convenhamos que perde muito da sua beleza e peculiaridade.

O papel arroz, Xuanzhi – 宣紙, tradicionalmente feito na província de Anhui, é o tipo preferido de papel. Também são utilizados papel de bambu, amora e cânhamo.

Tinta – bastão de tinta, são feitos de fuligem e aglutinadores, que devem ser esfregadas com água em um pedra de tintura, até que a consistência correta seja alcançada. As tintas engarrafadas ,prontas para uso, estão agora disponíveis, mas a tradição defende os bastões de tinta. O argumento é que as tintas já prontas podem borrar e escorrer depois do trabalho pronto.

Tradicionalmente, a caligrafia chinesa usa apenas tinta preta, mas calígrafos modernos tem usado outras cores nos seus trabalhos.

Pedra de tintura, ou tinteiro, é uma base de pedra, cerâmica ou argila, e é usada para moer o bastão de tinta tranformando-o em tinta líquida. Aprender a esfregar a tinta na pedra de tintura é uma parte essencial do estudo da caligrafia.

Os tinteiros chineses são altamente valorizados como objetos de arte.

Além disso, eles também usam o pote de água, o peso de papel e a tinta vermelha com seu carimbo pessoal.

Todo artista tem que ter seu próprio carimbo, é assim que eles assinam suas obras. E sobre a importância do carimbo na cultura chinesa, eu também já escrevi aqui no blog.

Para selar suas obras, ou documentos, é usada uma tinta vermelha, super tradicional na China, que é composta de óleo, incenso e uma mistura de 8 ervas.

Os estilos da caligrafia

Há 9 estilos de caligrafia reconhecidos, mas os principais são os 6 últimos desse gráfico.

O estilo tradicional de caligrafia e escrita, ainda é usado em Taiwan, Hong Kong, Macau e nas demais ‘Chinatowns’ espalhadas pelo mundo, já que normalmente essas pessoas deixaram o país antes da formalização dos caracteres simplificados como escrita oficial do mandarim. Na China, hoje a escrita oficial é com os caracteres simplificados.

A experiência

Bom, eu juro que tentei, mas pincel e tinta nunca foi para mim. Sou do time da caneta! =)

E na hora de escrever o nome, eles acharam por bem escrever o meu, assim eu teria uma bonita recordação da visita. Claro que concordei na hora!

Zài Jián!