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A lenda do Dragão em tempos modernos

Ando revendo alguns artigos que haviam caído no esquecimento, perdidos no meio de mais de 900 publicações aqui no blog. Os que acredito que vale a pena, vou republicar com uma repaginada no texto e configurações. Para quem é novo aqui, uma oportunidade de conhecer assuntos que nem sempre aparecem nas buscas. Para quem já me acompanha desde 2010, podem relembrar fatos e curiosidades que podem ter ficado esquecidas no tempo.

Espero que gostem dessa curadoria (rs) e aproveitem esse conteúdo tão rico.

Como estamos prestes a entrar no ano do Dragão, vou começar por esse artigo que diz tanto sobre Shanghai e a força desse símbolo na cultura chinesa.

Shanghai e a lenda do Dragão

Como vocês já leram em vários artigos aqui, a China é um país cheio de mistérios, lendas, superstições embasadas na cultura milenar e passadas de geração a geração como um enorme tesouro.

Cada lugar tem sua história e seus mistérios, e muitas vezes vão além do que nossa lógica ou crença pode explicar.

“Há mais mistérios entre o Céu e a Terra do que sonha a nossa vã filosofia”,

já dizia William Shakespeare…

Pois bem, assim sendo, Shanghai não poderia sair dos padrões lendários desse país. Se bem que há quem diga que essa história é tão real quanto os seus olhos que estão lendo essas linhas!

O crescimento de Shanghai

Outro assunto que sempre pauta os posts do blog é o quanto a China cresce de maneira assustadora muitas vezes, com construções de deixar qualquer um de boca aberta. O que se constrói em 10 anos em qualquer lugar do mundo, aqui se fazia em 1. Digo ‘fazia’, pois o ritmo desacelerou um pouco comparando com 20 anos atrás, mas mesmo assim ainda é mais rápido e dinâmico que o resto do mundo.

E não estamos falando de recapear uma avenida. Não… aqui é tudo mega, super, gigante. Estamos falando de construir um viaduto que corta a cidade inteira, para todos os lados, em 4 anos (1995 a 1999).

E nessa fase louca de desenvolvimento chinês, o tráfego já era um problema sério. A solução então foi construir os elevados, que teriam regras de circulação e aliviariam as ruas para acesso local.

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E assim foi feito.

Até que chegaram num cruzamento crucial entre todos esses elevados, na intersecção da Yan’an Lu com a Chengdu Bei Lu, e a obra teve que parar, pois não havia máquina que conseguisse perfurar o solo, para fazer a base da pilastra. E olha que já existiam centenas delas em pé, rasgando a cidade. Inclusive algumas a 300 metros de distância, que circundavam o cruzamento.

Mas aquele não havia jeito, nem mesmo implosões foram bem sucedidas.

Isso se tornou um problema enorme, já que ele seria o centro de tudo: a junção de vários elevados que se emaranham naquele local. Sua função era extremamente importante para a segurança de toda essa estrutura.

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O monge e o dragão

Como todos aqui já sabem (e se não sabe, fica sabendo), os chineses são muito supersticiosos. E também sabemos que quando a coisa aperta (mesmo no Brasil), saímos corrrendo, apelando para tudo e todos, sempre com a esperança de que uma ‘luz’ apareça para nos ajudar.

Um dos responsáveis pela obra foi então consultar um monge, que pertencia ao Templo de Longhua (um templo que nem é tão famoso na cidade), e o levou a visitar o local.

Chegando lá, o monge sentou-se onde a terra não daria lugar a vontade do homem. Meditou dia e noite por uma semana inteira. Sem comida, sem bebida, apenas sete dias e sete noites, de introspecção.

No final desse período, o monge disse: “Vocês tem um dragão abaixo do solo. Vocês despertaram e irritaram ele. Ele não vai deixar vocês perfurarem esse solo”.

Atônitos com o atraso da obra, e com um fato tão inesperado, principalmente se tratando da figura de um dragão, o animal mais amado e temido por essas terras, pediram ao monge alguma solução, o que fazer.

Foi então que o monge disse que não poderia ter revelado aquele segredo, que corria riscos por ter quebrado o silêncio sobre o fato.

Mesmo assim, avisou que eles deveriam fazer algo para satisfazer o ego do dragão, que estava nervoso por ter sido acordado. Caso contrário, esse viaduto não se completaria.

Mais uma vez, o monge ficou em estado de meditação para tentar acalmar o dragão.

Depois de alguns dias, disse: “O dragão está dormindo pacificamente. Agora vocês podem perfurar”.

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Passados alguns meses, o monge faleceu.

Pode ter sido uma coincidência, mas os chineses acreditam que ele morreu por ter revelado o segredo do dragão.

Homenageando o Dragão

Enquanto o monge estava ‘acalmando’ o dragão, os engenheiros e arquitetos suavam a camisa pensando numa maneira de apaziguar os ânimos do animal.

Assim surgiu, ao invés de uma simples pilastra, um monumento em homenagem ao dragão.

O mesmo foi projetado por Zhao Zhirong, artista renomado em Shanghai na época, onde aparecem nove dragões adormecidos, esculpidos em bronze. Além de que nove dragões juntos tem o significado de ‘vida longa’, algo bem necessário para uma estrutura que sustenta o principal entroncamento viário da cidade.

E como num passe de mágica, as escavadeiras trabalharam sem nenhum problema, como se nada antes as tivesse impedido.

Reza a lenda que o monge deu sua vida para o desenvolvimento da cidade. Se sua explicação tinha ares de devaneios ou não, era irrelevante naquele momento.

Os fatos eram claros: antes do monge, eles não podiam perfurar a terra; após o monge, o problema foi solucionado.

Lenda ou fato?

Para a maioria dos shanghaineses isso é fato.

Eles dizem que se estiver dirigindo em volta do pilar e buzinar ou piscar os faróis, vai sentir imediatamente uma sensação de paz. Se acontecer de estar de mau humor, buzine e  vai se sentir muito melhor.  Vai saber…

Para o mundo dos céticos, isso é mais uma das milhares de lendas que envolvem a história da China. Depois que soube dessa história, toda vez que passo por lá me sinto, por segundos,  transportada para outro mundo onde a iluminação espiritual, o folclore e o misticismo se misturam. Nunca apertei a buzina do carro, para saber se isso nos traz a paz mesmo, mas ainda vou tentar.

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Nessas horas é que nos damos conta de que nem tudo no universo pode ser explicado, e que cada dia traz um pequeno milagre de uma forma ou de outra.

E no final, a pilastra está lá, com seus nove dragões incrustados!

No mínimo, virou atração turística e deu uma certa graça aos quilômetros de pilastras cinzas espalhadas pela cidade.

Zái Jián.

8 pensamentos sobre “A lenda do Dragão em tempos modernos

  1. Pingback: 10 fatos sobre Shanghai | China na minha vida

  2. Lenda linda e posso dizer a você que acredito que ela seja verdadeira e que de fato houve uma pertubação ao Dragão adormecido. Que a pilastra perdure eternamente e que esse Dragão mantenha a serenidade junto com o Monge que doou sua vida para decifrar a vontade divina. 😉

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