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Chineses, cachorros e um NÃO à generalização.

Antes de começar a ler esse artigo gostaria que prestassem atenção em dois pontos:

Repudio completamente o Festival de Yulin no sul da China. Bem como não teria coragem de comer um cachorro ou gato, apesar de não ser vegetariana.

– O intuito desse texto é a NÃO generalização sobre o que os chineses comem, fazem e como agem. Na realidade, um alerta contra a generalização de qualquer fato, tendência, atitude, raça ou credo.

Afinal, nós brasileiros sabemos bem que nem todos nós gostamos de futebol e cerveja e sabemos sambar (nas devidas proporções é o mesmo caso).

Encontrei essa ilustração nesse blog e achei bem interessante para o tema!

Encontrei essa ilustração no blog No Limite e achei bem interessante para o tema!

Então amigos, leiam e entendam o ponto de vista de quem vive na China há muitos anos.

Ninguém precisa concordar, mas acho que ponderar o que se lê e as bandeiras que se levanta partindo de um post no facebook ou qualquer outra rede social é o mínimo que devemos fazer. Não estou generalizando que todos que compartilharam o abaixo assinado contra Yulin, sairam falando atrocidades de tudo que é chinês, isso seria hipocrisia de minha parte.

Mas temos que concordar que há muitas pessoas que vão dando ‘share’ ou ‘compartihar’ em muita notícia (seja ela qual for) que lê nas redes sociais, somente pelo título, sem nem sequer dar um clique e abrir a página onde o conteúdo está exposto na íntegra.

Como tudo começou

Esse meu desabafo não nasceu do nada.

Como muitos de vocês sabem, vivo na China há muitos anos e às vezes me cansa a maneira como as pessoas vêem a China e o povo chinês.

A China é o paraíso na terra? Não, não é. Há muita coisa errada, difícil de entender, mais difícil ainda de conviver, de se adaptar. A cultura e  o idioma são as principais dificuldades para um ocidental se adaptar aqui. Mas não é o inferno na terra também.

Aí você está de férias, num papo super animado com uma pessoa aí no Brasil (que é a minha realidade) e fala que mora na China. Um silêncio mortal aparece, aquela cara de dó no rosto de seu interlocutor e a famigerada pergunta: o que você come lá? Ou os mais saidinhos: Você já comeu cachorro? E depois disso, um suspiro solidário e a frase final: ai, não deve ser fácil! O ‘coitada’ e ‘que dó’ ficaram suspensos no ar, por um fio…

Bom, não vou entrar no mérito da questão se viver aqui é fácil ou não, até porque vivo com minha família há quase 11 anos e estamos todos bem, obrigada! E, uma comparação rasa, podemos sair de madrugada na rua, e voltar para casa são e salvos com todos os nossos pertences.

Aqui comemos comida (muito boa, por sinal) e nunca comi cachorro. Ao menos em sã consciência. E sim, existem ainda restaurantes que comercializam carne de cachorro, mas cada vez em menor número, principalmente no norte da China. E o número de chineses que repudia isso vem crescendo em ritmo acelerado. E o tal festival é algo pontual, numa determinada região, envolvendo um número ínfimo de chineses.

A postagem

Na sexta passada, vi um post numa conta de IG que sigo @always_china, achei interessante e repostei essa foto no IG do blog e também na fanpage no facebook.

Fiz isso, porque não concordo com a generalização de que todo chinês é cruel e que todo chinês come cachorro.

Milhões (mas milhões mesmo) de chineses não aceitam comer cachorros! POR FAVOR PAREM COM OS ESTERIÓTIPOS!

Milhões de chineses não aceitam comer cachorros! POR FAVOR PAREM COM OS ESTERIÓTIPOS!

Levei um susto com a repercussão disso, principalmente no facebook. Muitas pessoas apoiando essa bandeira da NÃO GENERALIZAÇÃO. Muitos chineses ou descentes que deixaram seus recados na página e muitos me escreveram inbox. Mas também houve aqueles que não leram, não pararam para pensar e para entender o objetivo da frase e saíram metendo o pau. A ponto de uma leitora escrever que haviam pessoas que precisavam voltar às aulas de interpretação de texto! (E foi sobre isso que escrevi lá em cima.)

Por isso resolvi fazer algumas considerações aqui:

O festival de Yulin, infelizmente, existe.

Ele acontece no inicio do verão no hemisfério norte, na cidade de Yulin (sul da China). Esse evento começou em 1995. E hoje há muitas manifestações de chineses que querem que o festival seja banido, proibido pelo governo chinês, mas se esbarra na tradição cultural da região (não estou justificando, só explicando).

Também não vou entrar nos detalhes do porque eles fazem o festival da maneira absurda que é, e o que os levam a comer a carne de cachorro, já que meu objetivo não é dar ibope a esse ‘evento’.

No jornal local, Shanghai Daily (em inglês), saiu uma notícia interessante sobre o repúdio dos chineses ao festival. O interessante é ver o depoimento dos locais, que acham que não fazem nada demais já que as pessoas comem bois, patos, coelhos e por aí vai. Sempre digo que cada lado tem seus argumentos, por piores e mais ridículos que nos possam parecer. Já que como carne, quem sou eu para contra-argumentar, por mais absurdo que acredite que seja comer carne de cachorro.

Em outro, o South China Morning Post (em inglês), mostrou a história de uma chinesa que arrecada dinheiro para ir a Yulin comprar o maior número de animais que consegue para salvá-los desse festival.

Cultura de comer carne de cachorro

Apesar de discutir sobre essa cultura, não ser o objetivo desse post, esse costume de comer cachorro, para quem não sabe, não é exclusividade chinesa! Na realidade é um hábito bem comum na Ásia – Coreia do Norte e do Sul, Vietnã, Filipinas, China e Taiwan. Mas, segundo a ANDA (Agência de Notícias de Direitos Animais) outros países fora da Ásia também possuem esse hábito, totalizando 9 regiões do mundo que consomem carne de cães e gatos. Fiquei espantada quando li e não gostei das fotos que vi. E esse artigo é de 2014.

E aí chego no meu ponto:

NÃO GENERALIZAÇÃO

Alguém concorda comigo que é muito injusto dizer que o chinês é um povo sem alma, que é cruel, que isso e aquilo (porque não preciso ficar repetindo o que li e ouvi), como se todos, os não sei quantos bilhões de chineses, matassem um cachorro por dia?

É justo dizer que todos os espanhóis são desumanos porque alguns saem nas ruas ferindo os touros por puro prazer e tradição?

Que todos os dinamarqueses são horríveis por conta da matança dos golfinhos que ocorre em nome da cultura de uma determinada região?

Que todo brasileiro apoia as rinhas de galo, afinal virou uma tradição de alguns locais no país?

Que todo francês é louco e que adora comer ‘foie gras’, independente do sofrimento dos gansos?

Não, não é.

Toda a generalização é perigosa, cruel, discriminatória, racista e preocupante.

E é só isso que queríamos dizer quando postamos a frase.

Entendam, precisamos urgente de menos ódio, menos generalizações, menos extremismos, menos crueldade com os seres humanos de modo geral.

Adoro metáforas, exemplos que nos ajudam a perceber o que estamos falando ou fazendo, e sempre que esses assuntos polêmicos aparecem e o povo sai crucificando alguém, ou um grupo, me lembro da história da Escola Base, em São Paulo. Tantos anos se passaram e a maldade do ser humano foi tão grande, que acabaram com uma família, um negócio, algumas vidas. Não, ninguém matou ninguém – de fato. Mataram a integridade, a moral, a ética e a paz daquele casal. Por pura falta de informação, de apurar os fatos. Pode até ser um exemplo exagerado, uma comparação não muito fiel, mas a raíz do problema é a mesma.

Pensem nisso.

preconceito

‘Em geral, o ponto de partida do preconceito é uma generalização superficial, um estereótipo, do tipo “todos os alemães são prepotentes”, “todos os americanos são arrogantes”, “todos os ingleses são frios”, “todos os baianos são preguiçosos”, “todos os paulistas são metidos”, etc. Fica assim evidente que, pela superficialidade ou pela estereotipias, o preconceito é um erro.’ Antonio Carlos Olivieri

Obrigada a quem leu tudo isso e entendeu meu ponto de vista.

Continuo dizendo não a Yulin, não às atrocidades cometidas pelo grupo que promove isso. Independente de raça, cor, credo ou nacionalidade.

Zài Jián!

 

Visite o China na minha vida no IG – @chinanaminhavida e no Facebook.

27 pensamentos sobre “Chineses, cachorros e um NÃO à generalização.

  1. Pingback: O ovo de plástico e as notícias falsas (fake news) sobre a China | China na minha vida

  2. É errado colocar um animal dentro de uma panela p ser cozido vivo, isso acontece com frequência na china, aqui pelo menos não cozinhamos o boi ou a vaca, na maioria dos frigoríficos é bem humanizado a forma do abate, claro que ainda tem muitos que não respeitam as normas, mas um dia chegaremos lá. Mas minha opinião é que se um dia esses povos com essa cultura cruel precisassem de algum apoio eu não ajudaria o que não faria diferença, pois sou uma só pessoa, mas que fique bem claro que todas as noites quando converso com Deus suplico a ele que leve essas pessoas cruéis e deixe elas pagarem pelo que fizeram.

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    • “Aqui é bem humanizado” acho que você nunca viu um matadouro na vida pra dizer isso… E se for pra julgar um povo pela cultura de alguns grupos pertencentes a ele, acho que o Brasil tá bem pior.

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  3. A pergunta que nos fazemos é o porque comemos tantos animais e nos escandalizamos com o fato de muitos comerem cães. O cão é um animal que confia no seu dono 100%, depois de ser aceito em uma família está disposto a lutar por você, ser seu companheiro, ele quer estar com você e tem o instinto de proteger o que é seu. Em caso extremo de fome até justificaria comer um cão ou gato. O que é revoltante é forma que vemos em qlguns vídeos, não sei se é prática comum; Queimarem, cortarem o animal vivo.
    Entendo claramente que não podemos generalizar, mas realmente fiquei ressabiado com comida chinesa e muito contrariado com essa cultura. Cultura teve um começo, alguns começaram essa prática e virou cultura, não significa que seja algo bom e que tem que ser respeitada, ao meu ver uma tolice pensar assim.

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    • Olá Davi,
      O que acontece em Yulin, é um fato isolado, uma minoria que acha que o cão quando abatido em situação de extremo estresse, a sua carne é afrodisíaca. Sim, um absurdo imenso.
      Mas isso está sendo amplamente combatido dentro da China, pelo próprio governo e a geração mais nova desse local, que veem isso como um ato cruel e sem sentido.
      Quando eu falo de respeitar a cultura, me refiro aos chineses e coreanos do norte que comem uma raça específica, criadas como porcos, e como vc bem escreveu no início do seu comentário, quem come qualquer tipo de carne não pode atirar a pedra em mais ninguém. Os indianos, por exemplo, nos acham uns loucos por comermos carne de vaca, já que lá o animal é sagrado… e assim vai.
      Cada vez mais os cachorros, como animal de estimação, estão presentes nas famílias chinesas, e assim esse hábito de comer carne de cachorro (não estou falando de Yulin, que é um extremo absurdo, e que deve ser contido já) vá morrendo com o passar dos anos.
      E eu, continuarei respeitando as diferenças culturais com que me deparo aqui todos os dias, não os atos de crueldade. Quando se vive numa cultura diferente da nossa, a visão do todo muda. E se quisermos viver bem nesse lugar, temos sim que respeitá-la, ou então arrumar as malas e ir embora. E, no momento, essa não é nossa opção!
      Abraço.

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    • Então lutem levantem a bandeira para que não se comam mais cachorros eles são queimados vivos quem faz isso não acredita em Deus nem na lei do retorno né cachorros tem sentimentos

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  4. Estou com o Matheus, comer cachorro, comer vacas, comer cuy é comer animais. O pedestal do cachorros é cultural, o ser humano reconstrói esse animal “à sua imagem e semelhança”, já que encontra nele características humanas. Mas sentir pena dos cachorros, não das galinhas, não das vacas, não dos porcos, é uma contradição que só se mantém devido a muito apego, a muito ego; “não matem os cachorros, são nossos amigos; faca no resto”. Como já disse Kurt Cobain, “tudo bem comer peixes, porque eles não tem sentimentos” (ou seja, nós não sentimos pelos peixes 🙂

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    • Olá Rodrigo. No fundo é isso mesmo. Outro dia encontrei um vídeo do ‘Porta dos Fundos’ que mostrava, da forma irônica e bem humorada que eles sabem fazer, exatamente o que vc escreveu. Mas agora não achei o link. Obrigada pelo seu comentário é visita ao blog.
      Abraço

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      • Humano é animal. Mas não é nada civilizado comer humanos, a não ser que você pertença a uma sociedade canibal.
        Um Homo Erectus não hesitaria em devorar seu semelhante para saciar sua fome, o Homo Sapiens sim. Isso porque a evolução nos ensinou a cooperarmos, e a cooperação se tornou uma condição natural para a sobrevivência.i

        O mesmo ocorre com os cães. Você nasce condicionado a associar os cães aos seus amigos humanos. Outros associam à proteína animal, ou à crença de que sua carne proporciona mais virilidade e vitalidade a quem consome.
        Mas por quê achamos tão errado comer cães?

        Te digo porquê.

        Porque evoluímos com eles. Matar cães para comer quando eles tendem naturalmente a nos ajudar a encontrar comida é um pecado evolucionista.

        Há milhares de anos atrás, o homem desenvolveu uma relação de cooperação com Canis Familiaris, da mesma forma que desenvolveu essa relação com cavalos, aves de rapina, camelos e até com o próprio Homo Sapiens.umano é animal. Mas não é nada civilizado comer humanos, a não ser que você pertença a uma sociedade canibal.
        Um Homo Erectus não hesitaria em devorar seu semelhante para saciar sua fome, o Homo Sapiens sim. Isso porque a evolução nos ensinou a cooperarmos, e a cooperação se tornou uma condição natural para a sobrevivência.

        O mesmo ocorre com os cães. Você nasce condicionado a associar os cães aos seus amigos humanos. Outros associam à proteína animal, ou à crença de que sua carne proporciona mais virilidade e vitalidade a quem consome.

        Antes disso, haviam apenas Canis Lupus. Note que, sem humanos, não haveriam cães.

        Eles (os cães) comprovadamente nascem para serem nossos aliados. Está nos genes deles.

        A cultura de comer cachorro pode ser uma tradição secular, mas a cultura do melhor amigo do homem é milenar; devorar animais que evoluíram para se tornarem nossos companheiros é contra-evolutivo.

        Uma verdadeira traição entre espécies. Durante todos esses anos, nos ajudaram a caçar, rastrear, pastorear, vigiar, alertar,proteger, entreter, entre diversas outras atividades mais, acabam no fim, sendo devorados pelos seus mentores, que a princípio os condicionou a sobreviver durante o fim das épocas glaciais por terem se familiarizado com seu aspecto de filhote mamífero.

        Não obstante, ainda o praticam de forma inegavelmente cruel, removendo os pêlos com o animal ainda vivo, sem mencionar a grande maioria que são animais roubados, ou que não foram criados para serem abatidos.

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      • Erich,
        Obrigada pelo comentário.
        Não sou a favor de comer cães também, mas temos que fazer um contraponto da nossa cultura com as demais. Sempre é bom perceber os dois lados. E essa foi minha intenção. Há chineses que simplesmente abominam essa prática, mas ela existe… e acho que só o tempo vai fazer com que essa minoria entenda o caminho da evolução como vc citou.
        Abraço.

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  5. Pingback: Curiosidades da mesa chinesa | China na minha vida

  6. Eu acho mais lamentável que os próprios chineses venham cedendo sua cultura alimentar por influência do ocidente. Vaca, carneiro, etc. são animais domésticos comuns na Europa e raros em várias partes do mundo até muito pouco tempo na história do homem como um todo. Eu acho super comum que ao redor do mundo as pessoas usem a proteína disponível ao seu redor. Insetos, cobras, cachorros, javalis, macacos, etc. Absurdo é querer que o mundo inteira coma apenas os bichos disponíveis na Europa. Isso me lembra que os índios do Peru comem porquinhos da índia e então os europeus usaram esses animais como bichos de estimação pra criar em casa… E isso chegou num ponto que a função original do animal que é a de alimentar causa estranhamento nos desavisados! Esse é o tamanho da lavagem cerebral da globalização. Sugestão de cardápio: Cuy fritinho e churrasquinho de llama!

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    • Obrigada pelo seu comentário Matheus. Sempre bom poder ponderar sobre outros pontos de vista. Em relação aos cachorros, não é só pressão do ocidente aqui na China. Os chineses descobriram os cachorros como dóceis animais de estimação e também existe a pressão interna para acabar com o festival por conta disso.
      Mas não dá para discartar sua reflexão de modo algum.
      Obrigada e volte sempre!
      Abraço.

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  7. Infelizmente, Chris, os discursos de intolerância e ódio gratuitos, aqui no Brasil, só aumentam, é assustador! Acho que o povo anda meio perdido, em meio a tanta corrupção e tanta violência existente. As pessoas se “armam” contra tudo e todos e, na maioria das vezes, falta-lhes critério e análise, para perceber onde deve haver o (bom) combate! É como você diz, uma simples má interpretação de texto é motivo para os ânimos se exaltarem… lamentável! Entendo bem sua indignação e compartilho dela, principalmente depois de conhecer de perto essa China maravilhosa! Beijokas a todos!

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      • Olá tudo bem com vcs? Eu respeito tudo,cada país tem uma cultura,acho legal devemos respeitar,mais a forma que estes animais são torturado eu não aceito.. Puxa aquele olhar de medo é triste…sei que este país é maravilhoso tem muitas pessoas de bom coração também.

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      • Sim, Antônio, e esse foi o ponto do meu artigo, não a generalização. Sei que é um tema polêmico, mas vc já viu de perto abaterem um porco, ou Carneiro? Principalmente em pequenos sítios, pois é… É triste também. E no final pessoas que fazem coisas boas ou más não tem sexo, religião , raça ou nacionalidade específica. Esse é o ponto. Abraço e obrigada pelo seu comentário.

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